quinta-feira, 14 de maio de 2009

Sob um denso...

Sob um enxoval de fogo o solo ardente

Demonstra que engoliu a trágica semente

Que faz nascer a planta atroz da combustão!

E essa planta se alastra em proporções tamanhas

Cujo fruto vermelho envenena as entranhas

Da terra estorricada ao sol da maldição!


Já não se escuta a voz dos vaqueiros na estrada!

A tétrica aridez da terra calcicada

Confessa a inquietação da prole que padece...

E há sempre pela estrada inóspita e comprida,

Uma criança com fome, um coração sem vida,

Uma cova, uma cruz, um adeus, uma prece!...


O triste fazendeiro imerso na descrença,

Debruçado a pensar sobre a janela imensa

Da casa da fazenda – outrora o sonho seu! –

Contemplando o vulcão a avassalar seu mundo,

Dirige o seu olhar cavernoso e profundo,

Ao rio que secou, ao gado que morreu!...


A pobre preta velha, exausta de fadiga,

Recostada ao varão da bolandeira antiga,

Assiste àquela cena inundada de ambrolhos...

Num gesto de temor que só bondade encerra,

Pede a deus que minore o suplício da terra,

Com tristeza no peito e lágrimas nos olhos!...


A palmeira senil que o vento quente embala,

Alevanta para o alto a cabeleira rala,

Que a chama devastou nas horas infelizes!...

E parece implorar aos céus, na sua mágoa,

Um minuto de paz ou mesmo um pingo d’água,

Que lhe caia na fronde e lhe molhe as raízes...


O solo é um forno aberto, escaldando o suplício

Da gente que carrega a cruz do sacrifício

Na treda rebelião de prantos e escarcéu!

E enquanto sofre um povo atirado ao relento,

Ninguém busca sanar aquele sofrimento

Que começa na terra e termina no céu!


O enorme espelho azul dos tristes céus escampos,

Reflete a solidão intérmina dos campos

Que dorme no sendal da paz desoladora!

Tudo sofre e padece ao fremir da fornalha,

E de encontro ao terror da miséria trabalha

Aquela gente heróica, humilde e sofredora!


A grande procissão dos mártires do Norte,

Como quem deixa a vida à procura da morte,

Anseia por matar os desenganados seus,

Confiantes na extinção da fome que soterra,

Porque no tribunal dos homens sobre a terra,

Não mais existe juiz – pois até deus já morreu.

3 comentários:

Encontros e Desencontros disse...

Lendo seu texto me emocionei.:)

Lau Cariri disse...

Que poema doido, meu amigo! Senti o calor de Patos em outubro só de ler.

Amanda Rosa disse...

Sei tão pouco de sua terra, mas enquanto lia, pude imaginá-lo dentro, e à espreita de tal realidade.