terça-feira, 27 de maio de 2008

A Justiça é cega e assexuada!

Sentença promulgada no Estado de Alagoas, em 1833.


















O adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant'Ana, quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra que estava de tocaia em uma moita de mato, sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra abrafolou-se dela, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimonio porque ella gritou e veio em amparo della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante. Dizem as leises que duas testemunhas que assistam a qualquer naufrágio do sucesso faz prova.

CONSIDERO:
QUE o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para conxambrar com ella e fazer chumbregâncias, coisas que só marido della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja Cathólica Romana;
QUE o cabra Manoel Duda é um suplicante deboxado que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quiz também fazer; conxambranas com a Quitéria e Clarinha, moças donzellas;
QUE Manoel Duda é um sujetio perigoso e que não tiver uma cousa que atenue a perigança dele, amanhan está metendo medo até nos homens.

CONDENO o cabra Manoel Duda, pelo malifício que fez à mulher do Xico Bento, a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE.
A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta Villa. Nomeio carrasco o carcereiro.

Cumpra-se e apregue-se editais nos lugares públicos.

Manoel Fernandes dos Santos
Juiz de Direito da Vila de Porto da Folha Sergipe
15 de outubro de 1833

Fonte:
Instituto Histórico Geográfico de Alagoas

domingo, 11 de maio de 2008

Pars II: Gênero e número dos substantivos

Salue, popule! Chegamos a nossa segunda aula de língua latina. E é bom saber que pelo menos duas pessoas, confirmadas, estão acompanhando-as aqui conosco. Hoje trataremos dos substantivos latinos, que, como eu já disse, podem ser masculinos, femininos ou neutros. Bom, ainda estamos na primeira parte de nossas lições, então, lembre-se de que, do vocabulário, só trataremos de maneira mais pormenorizada depois, okay? Pois muito que bem!

Os gêneros latinos (masculino, feminino e neutro) são distribuídos em cinco grandes – na verdade um deles nem é tão grande assim – grupos de palavras chamados Declinações. No entanto, deixaremos p’ra lá essa coisa de declinação, e trataremos dos substantivos que possam vir a aparecer aqui, da maneira que nos convêm. Lembre-se de que o nosso interesse é só mandar ver latinamente. O resto que se... Bom, em primeiro lugar, veremos o gênero dos substantivos, paralelamente ao do português. Mas nada de falar sobre Casos. Deixaremos isso para quando for o caso (trocadilho sem graça, hein?). Que seja! As palavras do nosso vocabulário serão apresentadas sempre no singular. ‘Cê deve ter em mente que as que terminarem em -a, -es ou -trix serão femininas; as que acabarem em -us, -ix ou -tor, masculinas; e em -um ou -en, neutras. Caso haja alguma exceção, eu avisarei. Assim, a palavra cauda, -ae, que em latim quer dizer cauda mesmo, mas também pode ser tida no sentido de pênis (o porquê deixaremos para as lições em que eu apresentarei o vocabulário), é uma palavra feminina, bem como fututrix, -tricis, [futútriks]. A palavra cinaedus, -i [kináydus], por outro lado, termina em -us, então é masculina. Cunnus, -i [kúnnus] também é masculina, pois, como a outra, acaba em -us. scortum, -i [skórtum] é neutra, termina em -um. E assim por diante.

Como eu já falei, não há artigos em latim. Isto quer dizer que eles, os artigos, só têm de aparecer na tradução. Se o artigo vai ser definido ou indefinido, só o contexto pode indicar, mas a verdade é que nem sempre eles serão necessários à tradução. Agora, lembre que quem dita o gênero do artigo, na tradução, é o gênero da palavra em português. Há sempre quem pensa: “Mas no português não há neutro, magister (professor).” Ora! Por isso as palavras são sempre traduzidas, em português, por equivalentes femininas ou masculinas. Não há moído algum! Culus = o (um) cu; scortum = a (uma) puta; cunnus = a (uma) vulva, ou vagina. Simples! No entanto, a tradução de cunnus pode ser mais a gosto do tradutor, entende?

Se você já captou bem o que foi dito até aqui, podemos falar agora do plural. Vejam bem... não tem essas letrinhas que apareceram depois das palavras que eu usei como exemplo? Pois bem, nós podemos usá-las como referência para achar o plural das palavras que as acompanham. No caso dos substantivos terminados em -a e -us, o que vier depois da virgula coincide com seu plural. Basta substituir o -a ou -us por, respectivamente, -ae ou -i (cauda/caudae [káuda/káuday]; cinaedus/cinaedi [kináydus/kináydi]). Já se a palavra terminar em -um, ao invés de -i, cê deve pôr -a (scortum/scorta [skórtum/skórta]). Agora, com palavras terminadas em -trix, -ix, -tor e -en as coisas ficam um pouco mais complicadas. Você vai fazer o seguinte... perceba que o que vem depois da vírgula não é tão regular como nos casos precedentes: fututrix, -tricis; fellator, -toris. Notou? Agora veja que o -is final manteve-se. Pronto! Cê vai substituir esse -i- por -e- (fututrix/fututrices [futútriks/fututríkes], fellator/fellatores [fellátor/fellatôres]). Agora, se a palavra terminar em -en, o -is será substituído por -a (inguen/inguina [íngüen/íngüina]). E é isto!

Por fim, eu só quero apresentar o modelo para boa parte dos adjetivos e pronomes adjetivos que usaremos. O modelo é muito simples: parua, -us, -um [pár:wa, pár:wus, pár:wum]. Ele trás, respectivamente, as formas para o masculino, feminino e neutro. Isto quer dizer que em latim o adjetivo concorda em gênero com o substantivo? Claro que sim! Exemplo: “Oh culus magnus, Deus!” / “Oh cu grande (cuzão), meu Deus!”

Mas lembre-se: não é o fato da palavra terminar em -us que o adjetivo também deve terminar, mas o fato de ela ser masculina. Assim, algumas vezes suas terminações não coincidirão: fututrix bella.

Sobre o pronome adjetivo meus, -a, -um; perceba que em “Oh culus magnus, Deus!” ele, como os pronomes pessoais do caso reto, nem sempre precisam aparecer em latim, ainda que surjam na tradução. Você só vai precisar colocá-lo na frase latina se quiser enfatizar, por qualquer motivo, o pronome em questão ou para não gerar algum tipo de ambigüidade. Seria algo como nessas frases: “Deus do céu, por que foi acontecer isso?” e “Meu Deus do céu, por que foi acontecer isso?” Percebe que há uma ênfase maior no segundo caso, embora no primeiro o “meu” esteja subentendido, afinal quem se direciona a Ele dessa forma é porque O toma como seu, não é vero?

Neste momento, meu caro, minha cara, tento aprendido o verbo esse, e conhecendo algumas palavras, você já pode formar algumas pequenas frases. Quer ver? Bom, quantas vezes não gostaríamos de fazer a alguém uma pergunta indecorosa, mas somos impedidos por causa do ambiente? Pois é... ‘cê pode usar o latim p´ra isso, desde que o tal alguém esteja por dentro. Agora não se esqueça do modelo frasal que eu apresentei na lição passada, bem como da flexibilidade dele. Vou dedicar agora um tempo a descrever em linhas gerais como ele funciona. Pense na pergunta: aquela menina é quenga? Em latim você até que pode escrever a frase nesta ordem (Illa puella est scortum?), mas o importante é que a pergunta adapte-se a sua intenção de maneira passional. Eu explico: se saber se ela é puta for a grande questão – sei lá, por você está afim – então a frase ficaria melhor assim: Scortum est illa puella? Indo p’ro final o que é menos importante. Agora, se você está surpreso com o fato de aquele menina, e não outra, ser quenga, então a pergunta ficaria melhor assim: Illa puella scortum est? Perceba que o verbo foi pro final da frase, por ser a parte menos importante da frase. Os adjetivos latinos tendem a ficar depois do substantivo com que concordam, mas em latim, até isso é meio relativo a nossa intenção: Illa scortum est puella? Por isto o estudante tem de estar atento a quem está ligado determinado adjetivo. Até a próxima, pessoal!

Vocabulário

Puella, -ae [púella]: menina, moça.
Scortum, -i [skórtum]: puta, quenga.
Cinaedus, -i [kináydus]: homossexual masculino, gay.
Fututrix, -tricis [futútriks]: mulher que dá a muitos ou a alguém específico, rapariga.
Cauda, -ae [cáuda]: cauda, rabo. Mas pode ser usado para se referir ao pau, pênis.
Magnus, -a, -um [mágnus]: grande.
Paruus, -a, -um [par:wus]: pequeno.
Ille, illa, illud [ílle]: aquele, aquela, aquilo.
Bellus, -a, -um [béllus]: belo, bonito.
Culus, -i [kúlus]: cu.
Fellator, -toris [fellátor]: chupão.
Cunnus, -i [kúnnus]: vulva, vagina, buceta.
Meus, -a, -um [mêus]: meu, minha.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Pars I: Quidquid latine dicitum sit, altum uidetur

(Parte I: o que quer que tenha sido dito em latim parece imponente)

Olá, seja você quem for. Eu sou o Magister Ludi. Bem-vindo a nossa primeira aula de língua latina pela internete. Uma co-produção da equipe do Soda Cáustica e do departamento de línguas clássicas da... Bom, isso não vem bem ao caso. O fato é que, como você já deve estar sabendo, o objetivo deste curso tem em vista o ingresso do estudante no universo deste idioma antigo só que pela porta dos fundos, ou seja, pelo modo de falar do povão romano, sobretudo, claro, naquelas horas em que ele está totalmente injuriado e quer mesmo é botar pra quebrar. Assim, este curso é direcionado exatamente pra você que detesta Seu Fulano de Tal que não perde a oportunidade de demonstrar seus parcos conhecimentos de língua latina e sai sempre com uma do tipo: “ah – qualquer que seja a palavra –, do latim...” Faça-me o favor.

O curso será dividido em duas partes das quais, a primeira, tratará da apresentação de todas as informações que eu julgar necessárias ao bom uso do vocabulário que você então ficará de posse na segunda parte do curso. Além disso, o vocabulário virá acompanhado de um breve comentário – já que naquele tempo, nem todas as palavras eram usadas como hoje – e de toda sorte de exemplos que possam facilitar a aprendizagem deste lado do idioma do Lácio infelizmente negligenciado pelos professores. Agora, chega que enrolação e vamos logo à aula!


Se você ainda não sabe, caro aluno, ou aluna, o latim é escrito por meio de um alfabeto muito, muito conhecido chamado... alfabeto latino. Isso mesmo! Aquele com o qual aprendemos a escrever o português – só que, claro, no século I antes de Cristo, período em que este idioma estava realmente bombando, ele não era exatamente o mesmo que nós conhecemos hoje. Primeiro porque naquela época não havia letras minúsculas, coisa que só apareceu na Idade Média; nem, por não existirem os fonemas correspondentes, as letras “v” e “j”, adicionadas a ele pelo francês Pierre de la Remée só lá pelo século XVI. Por fim, mas não necessariamente nesta ordem, o “y’ e o “z” surgiram para que fossem traduzidas algumas palavras advindas do grego, e a letra “k”, que já existia bem antes disto, era como se não existisse – parece que ninguém ligava muito pra ela. Hoje, as escolas que ainda se prestam a dar aulas de latim não abrem mão das minúsculas e, em alguns casos, também não do uso do “v” e do “j”, ou de pelo menos uma delas. Por nossa vez, optamos não adotar aqui estas letras, mantendo-nos assim o mais fiel possível ao tempo daqueles caras esquisitões que usavam vestidos, sandálias de dedo e adoravam ver homens massacrando uns aos outros no circus até a morte.

Abecedarium latinum
A,a (ā) – B,b (bē) – C,c (kē) – D,d (dē) – E,e (ē) – F,f (ēf) – G,g (guē) – H,h (rā) – I,i (i) – K,k (kāppa) – L,l (ēl) – M,m (ēm) – N,n (ēn) – O,o (ō) – P,p (pē) – Q,q (qu) – R,r (ēr) – S,s (ēs) – T,t (tē) – V,u (u) – X,x (ix) – Y,y (üpsilon) – Z,z (dzēta)

Como não quero tornar você um profundo conhecedor deste idioma, as questões relativas à pronúncia dele serão resolvidas com a transcrição das palavras latinas à portuguesa, sempre que houver necessidade. No entanto, o latim é uma língua cheia de esquisitices e por isso mesmo vamos enumerar aqui as mais importantes para o nosso curso. Em primeiro lugar 1) o fato de ele, o latim, não admitir artigo, qualquer que seja, definido ou indefinido; 2) de não possuir pronome pessoal do caso reto para as terceiras pessoas, do singular ou do plural; 3) de, diferente do português, seus substantivos poderem ser masculinos, femininos ou neutros; e 5), por fim, de os pronomes pessoais do caso reto que existem só precisarem aparecer na frase relacionados a algum verbo, caso o falante queira enfatizá-lo. Mas e se você quiser enfatizar uma terceira pessoa, o que deve fazer? Bom, neste caso, você poderá usar um demonstrativo pra isto, como veremos mais adiante.

Outra coisa estranha é que a ordem das palavras nas frases do latim não é tão determinada quanto a do português. No entanto, há um modelo-base com o qual nós podemos nos apegar. Qualquer “violação” a esse modelo deverá ser assim guiada pelo intuito, por parte de quem está se expressando, de enfatizar algum termo em especial. Neste caso, o termo escolhido deve vir antes dos demais, seguindo uma espécie de ordem de importância.

Modelo da frase latina
Sujeito – Verbo de ligação – Predicativo do Sujeito

Ex.: Marcos é um idiota. Um idiota Marcos é. Marcos um idiota é. Um idiota é Marcos.
(acima, você tem a frase segundo o modelo e, a seguir, ela de outras maneiras possíveis, em latim, claro)

Por fim, meu caro aluno, ou aluna, será importantíssimo que você tenha na ponta da língua o verbo latino Esse (na pronúncia o “e” final não pode ter m de “i” jamais) que equivale aos nossos ser/estar. Então, fica aí sua primeira, e uma das poucas, obrigações: decorar o verbo Esse no indicativo presente. Então, até a próxima!

Verbo Esse (ser/estar)
Singular: [ego] sum – [tu] esest
Plural: [nos] sumus – [uos] estissunt

PS.: lembre-se: os pronomes latinos equivalentes aos nossos do caso reto só precisarão aparecer numa frase se, e somente se, você quiser enfatizá-los. Caso contrário, não.

Ex.: eu sou = sum / EU sou = ego sum
(e assim por diante com os demais)