segunda-feira, 28 de abril de 2008

Latim, hein? Eu sei dizer uma coisa em latim...


Olá, povo. Bom, se você ainda não sabe, nem haveria como saber mesmo, a partir dessa sexta-feira, dia o2 de Maio, o Soda Cáustica disponibilizará um instrutivo curso, em sabe lá Deus quantas lições, de língua latina, preparado especialmente p’ra você. Mas não se preocupe, não! Nosso objetivo é fazer com que as pessoas tenham o que dizer, quando algum engraçadinho, tentando se passar por fulano de muita instrução, sair com um comentário do tipo: “Ah, essa palavra é do latim...”, e botar p’ra descer no sujeito com o idioma dos Caesares.

Além de adquirir um vocabulário dos diabos, com toda sorte de palavrões e xingamentos que estavam na boca dos pullati romani, você poderá também tirar suas dúvidas, com relação às lições, e, claro, dar sugestões para o bom andamento do curso. Então, não se esqueça. Será a partir dessa quarta-feira, aqui, no Soda Cáustica.

PS.: Caso você tenha já vontade de saber como se diz um palavrão de sua preferência e quer sabê-lo o mais rápido possível, pode usar o espaço dos comentários p’ra perguntar.

Por que sou Macabéa...

Pois bem, aqui estou!
Nossa! Isso é quase espiritual.

E que não estranhem, caros homens desse blog, escrita de mulher é lacrimejante assim mesmo! Quero dizer que esse texto, como tudo que escrevo, trata-se de plágio. Eu nunca que inventei uma palavra. Todas me foram ensinadas, ofertadas ou atiradas. Portanto, não haverá nenhum copyright, podem utilizar as frases em pára-choques de caminhão ou em camisetas de conclusão de curso, se quiserem.

Venho, então, como havia prometido aos caros Zé e Lau, (espero que isso aqui seja, sobretudo, mural de diálogos) explicar por que sou Macabéa e não haveria de ser outra. Mas antes de tudo – Será que existe algo antes de tudo? – Vou tentar explicar-me usando frases curtas, porque não sei falar, mas que fique claro.

O amor é uma inflamação grave contagiosa secreta.

Deus é o vazio da mente.

A vida é o contrário incessante do não.

O não é só uma relutância.

Escrever é, solitariamente, cortar-se, ver o sangue jorrar, verter álcool e acender fósforo, juntar as cinzas numa urna e emudecer-se.

Ler é o prazer doentio de descascar uma ferida.

O único livro mesmo é a vida, o que a gente ler é só prefácios.

E por fim, tudo que a gente ama de verdade nesse mundo a gente cospe e beija ao mesmo tempo. (Verdades contestáveis)

Eu sou Macabéa em sua incompetência para a vida.
Eu sou Macabéa em seu desaprumo.
Eu sou Macabéa, que era, só porque tinha de ser.
Eu sou Macabéa virgem e inócua, incapaz de ver-se nua num espelho.
Eu sou Macabéa, feliz por tomar café frio.
Eu sou Macabéa, ainda criança, mastigando papel e imaginando uma coxa de frango.
Eu sou Macabéa, quando de tanta mesmice, à noite já não se lembrava o que se passara pela manhã.
Eu sou Macabéa questionando como é que duas consoantes podiam ficar coladas numa sílaba.
Eu sou Macabéa, quando especulava com sua imaginação diminuta o significado das palavras ouvidas no Rádio-Relógio.
Eu sou Macabéa pensando, sem muito sucesso, o que poderia ser efeméride, renda per capita, heurística...
Eu sou Macabéa, quando de seu rosto amarelecido gritava o contraste de um batom berrantemente rubro e a dentina exposta de seu sorriso.
Eu sou Macabéa rindo para as pessoas que não riam de volta, porque não a enxergavam.
Eu sou Macabéa, quando ela finge estar doente só para se dar ao luxo de não fazer nada.
Eu sou Macabéa que achava, sim, algo de si mesma, mas não sabia o quê.
Eu sou Macabéa, cedinho, quando ao se acordar não conseguia lembrar quem era e só depois de algum tempo recordava que era datilógrafa, virgem e que gostava de Coca-Cola.

E tantas outras semelhanças que eu, momentaneamente Macabéa, não sei precisar todas. Sei que sou nordestina e acredito em palavras doidas que nem felicidade. Sei que mesmo em meio à miséria nunca venderia o corpo, muito embora seja ele nossa única posse real. Sei de coisas das quais não posso dar provas. – Isso será fé? – Sei de informações que nunca me serão úteis como “O Bhagavad Gita foi escrito há seis mil anos!”. Sei que estou no mundo só por causa da TV. E sei que do resto, tenho pouco ou nenhum entendimento.

Agradecimentos sinceros à Rodrigo, que sabe mais de mim do que eu mesma!

A Clarice Lispector por me fazer entender que toda dor pode ser também uma forma de salvamento!

E poxa, voltar a escrever me deu dor no cérebro!

sábado, 26 de abril de 2008

Bibliotecas Públicas de Patos - Parte II

A Biblioteca Municipal Allyrio Meira Wanderley

Pegar um livro para ler às vezes parece difícil. Você já é inclusive familiarizado com a leitura, gosta da coisa, o que tem em casa já foi lido e tudo o mais. Porém, de vez em quando, mesmo quando lhe bate a vontade de ler algo de que já ouviu falar, ainda assim sua resposta é quase sempre uma negativa. Comigo isso ocorre porque normalmente eu quero o livro que desejo ler, e estando ele noutro lugar, isso me desestimula. Mas você, leitor de Patos, se age assim, ou de modo similar, espero que mude de atitude, assim como pretendo mudar, depois de conhecer melhor o acervo da biblioteca municipal. É para isso que estou aqui e meu papel terá se cumprido caso este texto obtenha algum êxito.

Ela possui um número muito relevante de obras. De início, eu poderia até dizer que quem pretende juntar mesmo uma bibliografia acadêmica, isso pode ser bem viável. É claro que não dá pra encontrar tudo o que uma pesquisa dessa natureza busca, mas o aluno do ensino superior consegue montar certo material de pesquisa suficiente para um tempo e parte de seu trabalho – isso dependendo, claro, da sua área. E falo mais especificamente das Ciências Humanas. Quem segue na vereda da Teoria Literária ou Literatura, pode sim encontrar pouso seguro por uns tempos nessa biblioteca. Encontrei livros de Tristão de Athayde, Antonio Cândido (Formação da Literatura Brasileira), e um pelo qual desenvolvi interesse particular, Fenomenologia da Obra Literária, de Maria Luiza Ramos. Já outros pesquisadores podem preferir ler Gilberto Freyre, ou quem sabe uma publicação organizada pela UFPB chamada Contos Populares da Paraíba (Patos). Numa rápida folheada, entendi que se tratava de histórias populares contadas na nossa cidade e que foram colhidas e catalogadas por pesquisadores do Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional da UFPB.

Mas não quero me restringir neste texto, nem restringir as obras de lá, unicamente ao público acadêmico. De maneira alguma. Não escondo minha paixão pela literatura, e para quem também gosta, eu adianto que você pode “perder” muito tempo para ler tudo o que pode lhe atrair do acervo. Se acaso tenha vontade de ler muita coisa de um único autor, as melhores pedidas são as coleções. Encontrei algumas que traziam, se não todas, mas pelo menos muitas obras de alguns nomes, tais como Machado de Assis, Guimarães Rosa, Gregório de Matos, Eça de Queiroz, José de Alencar, Graciliano Ramos, o velho Dostoiévski (numa edição clássica da José Olympio), Jorge Amado, e a que me deixou com mais vontade foi a de Érico Veríssimo (gigantesca, ocupando quase uma linha completa da estante).

Coleções como estas são ótimas. É uma empreitada que sempre tive vontade de travar: ler tudo de determinado autor. Prometo a mim mesmo que Érico Veríssimo será meu desafio. Mas além das coleções, livros isolados que sempre tive desejo de ler estão lá também (ou melhor, eu os descobri para mim). Guerra e Paz, é um exemplo – numa edição bastante razoável, me pareceu. Seus dois volumes volumosos não me causaram medo já que estão num estado de conservação bom. Outro prosador russo que lerei de lá é Turgueniev, autor de Pais e Filhos. Dostoiévski faz paródia de um personagem desse romance em Os Demônios. Achei também os volumes da famosa (?) Tragédia Burguesa, de Octávio de Faria. Sempre quis ler. Há outro que já iniciei uma vez a leitura mas não concluí, Cidadela, do Antoine de Saint-Exupéry.

Passado o devaneio dessas descobertas agradáveis, voltemos ao chão. Por mais que fossem educados e prestativos os funcionários da biblioteca (e o são mesmo), eles não podem autorizar a entrega de um livro para alguém locar. Essas são as regras. E não são eles que as fazem. Por razões que não sabemos, a Biblioteca Pública Municipal Allyrio Meira Wanderley não pode ceder seus livros dessa forma. Não existe um cadastro onde se possa se registrar devidamente para ter acesso às obras da forma mais plausível que conhecemos. Fala-se de uma Lei que estaria em trâmite para regular esse quesito, mas até agora nada. Então, por ora, é tomar assento a uma daquelas mesas em uma das três salas de leitura - divididas em Infantil, Adolescente e Adulta - e ler por lá mesmo. O mais estranho é a necessidade de uma solução legalista para resolver uma coisa que é a mais natural e comum de todas para o funcionamento de uma biblioteca. Além disso, outro problema é a catalogação precária dos livros, embora estejam dispostos pela ordem alfabética do sobrenome dos autores (atitude brava e nobre dos poucos funcionários), mas a forma correta é outra. Apesar de haver livros em bom estado de conservação, a grande maioria é velha, não vi sinal de novas aquisições nas seções em que passei. Para uma biblioteca que leva o nome do maior escritor das Espinharas, muita coisa está devendo. Mas esperamos que eles tentem, Allyrio, todos nós ainda esperamos…

Faço agora uma lista de algumas coisas que descobri:

Coleções:

Eça de Queiroz;
Machado de Assis;
Guimarães Rosa;
Dostoiévski;
Gregório de Matos (dois volumes);
José de Alencar (incompleta);
Érico Veríssimo;
Jorge Amado;
Graciliano Ramos;

(e cito também uma coleção chamada Clássicos Jackson que possui uma variedade muito grande. Há ainda uma sala que foi doada pela família do falecido professor Manoel Messias onde se encontra uma coleção completa da obra de Victor Hugo).

Livros:

Octávio de Faria (Tragédia Burguesa)
Carlos Drummond de Andrade (Antologia Poética)
Leon Tolstoi (Guerra e Paz)
Leonardo Boff (A Graça Libertadora do Mundo)
Dyonelio Machado (Os Ratos)
Antoine de Saint-Exupéry (Cidadela)
Turgueniev (Pais e Filhos)

Aceita uma sugestão? Faça a mesma experiência: vá à biblioteca municipal (é aquele prédio azul que fica na rua por trás da Igreja da Conceição, próximo ao cruzamento com o Prado) e descubra o que não espera.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Manifesto pelo direito à dúvida, ao silêncio, à tristeza, à mudança de rumo e a tantas outras coisas que, esquecidas, nos tornam imbecis

É mais produtivo começar por um não, do que por um chamado à união; porém, no fim a gente sim-naliza com outras idéias. É onde coincide meu primeiro sim e meu último não que resplandeço.

Mas neste manifesto queremos tudo, menos ser produtivos.

Quem são esses que dizem “queremos”? Ora, pois, somos eu e todas as pessoas que se acham oprimidas pela tirania da alegria idiota, artificialmente produzida por esses sacerdotes do ridículo.

Sentimo-nos subjugados pela obrigação de distribuir sorrisos a todo custo e de ter as esperanças que eles – seja lá quem eles sejam – nos sugerem. O sucesso vaticinado por esse mundo-riso não nos satisfaz. Absolutamente. Sua felicidade mórbida e essa tranqüilidade televisiva nos enjoam.

Rejeitamos tudo aquilo que nos dão sem que o conquistemos. Tudo o que nos impõem para ser nosso, sem que possamos torná-lo nosso: rejeitamos o sonho ingênuo do sucesso, da fortuna e da felicidade hipocritamente sorridente: esse paraíso artificial onde não cabem nossas fraquezas, nem nossos suores e salivas, nem nossas alturas geladas, nem nossos desertos sombrios, nem nossas almas escondidas. Rejeitamos, também, os sacrifícios exigidos para lá se chegar: sacrifício das idéias livres e pueris; das belezas inúteis de um poema de Neruda, de uma partita de Bach, de uma modinha caipira, de uma dança de roda; sacrifício das línguas cansadas de repetir o politicamente correto; sacrifício dos ouvidos agredidos pela anti-poesia e pela anti-música; sacrifício do sonho de ter sido caminhoneiro, professor, agricultor ou pescador; sacrifício das explosões de raiva e de asco a todas as coisas que nos nivela ao medíocre. Rejeitamos, por fim, a morna paz prometida, uma paz quieta, estupidamente calada, uma paz amolecida de quem espera a morte.

Temos náuseas em participar de palestras de motivação, em ler livros de auto-estima, em assistir a programas de lições-de-vida. Arrepia-nos ter de privar da companhia de gente mesquinha que decora e repete essas frases repugnantes de auto-ajuda que nos servem de entorpecentes, não nos permitindo ver com nossos olhos, falar com nossas palavras e alegrarmo-nos com nosso espírito.

Estamos exaustos de dever acreditar num mundo tedioso, feito só de sorrisos, e de dever sonhar os sonhos que nos deram a sonhar – a fama da televisão, a carreira impecável, os bens de demonstração – sem poder sonhar os sonhos que aquilo que não há no nó da palavra eu quer sonhar.

Dentre tantos direitos que nos disseram que são humanos, esqueceram do essencial direito de dizer o contrário, ainda que de forma desexata, como essa mesma palavra.

Acreditamos, ao contrário, que estamos de vez em quando tristes, até sem motivo, ou por um motivo bastante infantil para não querermos dizê-lo, porque há momentos em que nosso espírito não suporta senão palavras baixinhas e discretas, ou nem palavras suportam... Reivindicamos o direito ao silêncio, seja contemplativo ou não.

Reivindicamos o direito de lembrar da nossa história pessoal e da nossa história coletiva e de transformá-la em estórias para contar às nossas crianças. Reivindicamos o direito que já temos de estarmos calados quando nos é dado a falar; e de gritarmos incessantemente na hora mais incômoda, em que não somos chamados a decidir ou a opinar. E, ainda, o direito de gaguejar...

Reivindicamos, também, o direito de estar fora dos quadros: de não ser funcionário concursado, de não ser prostituta ou corrupto ou alcoólatra ou fumante inveterado ou religioso praticante; de não ter sido o melhor aluno da sala, nem o pior; de não amar a empresa em que trabalha; de não freqüentar templos ou cabarés. O direito de ser anônimo e de querer continuar anônimo. Queremos conquistar o direito inalienável de não participar da opinião pública, de mudar de idéia e de não ter opinião sobre escândalos políticos. O direito de não ter lido os grandes mestres da literatura mundial, de não ter assistido a filmes cult, de não saber a história da MPB. O direito de esquecer o compromisso, de não ir no combinado, de estar mal-humorado ou de nem ligar. E o direito de não assinar abaixo-assinados ou manifestos...

Cremos firmemente que jornais e novelas têm tido o mesmo formato e têm dito a mesma coisa, por isso mesmo, desligaremos a TV no horário nobre, conversaremos na calçada sobre assuntos nada estratégicos, contaremos piadas sobre o ridículo das paixões humanas, choraremos pelo que não pudemos ter sido e pelo que não poderemos mais ser. Ficaremos tristes pelos aviões que transportam bombas, pelas quantias incontáveis de dinheiro que sobrecaem nos ombros de pouquíssimos; pelas crianças pobres que não fazem seus brinquedos porque estão ocupadas em morrer de fome – estas nada podem ter porque tudo lhes foi negado: comida, brinquedos, sonhos... E pelas crianças ricas que não fazem seus próprios brinquedos porque estão ocupadas em morrer empachadas – estas nada podem desejar, porque tudo já lhes foi dado pronto: comida, brinquedos, sonhos...

Acreditamos em heróis que fracassam. Admiramos estrelas pequeninas, vistas só quando não olhadas, que no interior de nós brilham e nos inspiram: todos os que fracassaram, foram envenenados, crucificados, queimados em praça pública ou somente mal-entendidos; os suicidas, os loucos, os débeis, os gordos, os mancos, os suboficiais, as meninas de prostíbulo, os que nunca existiram...

Avisamos que seremos errados, não passaremos no vestibular, nem teremos uma carreira brilhante. Avisamos que engordaremos, sim, e nossas mulheres terão celulite, e nossos maridos serão calvos; que nossa beleza mora mais ao longe do que nessa estética fúnebre dos desfiles de moda. Avisamos que não queremos conselhos de superação quando estivermos acabrunhados e que, quando estivermos tristes, não queremos outro consolo senão o de saber que tudo é passageiro, inclusive a alegria...

Conquistaremos, sem o almejar, as distantes terras do desconhecido. Mudaremos de rumo, sem o planejar, sempre que nosso estômago avisar que a rota que seguíamos está infestada de carniceiros. Expulsaremos de nosso convívio, sem alarde, os que estiverem permanentemente felizes, os que não chorarem com nossas mágoas, os que não errarem conosco, os que não calarem, os que não faltarem com a etiqueta, os que não desrespeitarem o protocolo e os que não tiverem por onde ser desprezíveis.

O inexistente nos seduz. Estamos grávidos de outros mundos, cada qual destes com sua linguagem inebriante, pois não desejamos senão nos embriagar pela fala. Daí nascerão nossa verdadeira alegria e nosso anônimo sucesso, com os temperos do inevitável pôr-do-sol...

Por concordarem com este manifesto, não o assinam:
Vincent Van Gogh – pintor holandês que decepou a própria orelha
Joana D’Arc – agitadora francesa, mística, queimada na fogueira
Jesus de Nazaré – místico e teólogo judeu, abandonado por seus amigos, torturado e crucificado
Sócrates – filósofo grego suicidado (sic!) por seus conterrâneos, por exercitar jogos de pensamento.
Sidarta Gautama – pensador e místico mal-entendido por seus seguidores
Zaratustra – filósofo e teólogo que não morreu por não ter nascido
Friedrich Nietzsche – filósofo alemão que nasceu antes do tempo e morreu louco
Cecília Meireles – poetisa brasileira que, segundo testemunha, era abobalhada
Fernando Pessoa – poeta português que morreu de cirrose hepática
Alberto Caeiro – poeta que não existiu, mas viveu
Álvaro de Campos – poeta que também não existiu, mas escreveu Tabacaria
Cacique Seattle – indígena que aplicou um koan no presidente dos EUA
Riobaldo Tatarana – jagunço, filósofo e teólogo que viveu sem ter existido e se apaixonou por um homem que era mulher
Diadorim – mulher que era homem e provocou grandes revoluções na linguagem
D. Sebastião – rei português que, derrotado numa guerra, está sempre para voltar
Peixe-Grande – contador que tornava qualquer história sisuda uma maravilhosa estória
Teresa de Ávila – mulher que descobriu que Deus pode ser uma alegria orgástica
Ludwig Wittgenstein – filósofo alemão que abandonou o fracasso que se lhe representava seu sucesso
Ludwig van Beethoven – homem surdo que compunha belíssimas músicas
Mahatma Gandhi – político por vocação, indiano, que abalou a política com gestos leves
Guimarães Rosa – estranho escritor, cujas frases são objetos de feitiçaria e que morreu como Moisés
Jacob Boheme – teólogo que afirmava que Deus brincava bastante
Turuna Tântalo – o mais recente dos antigos pensadores
Rubem Alves – sacerdote expulso de sua confraria por deixar os tapetes pelo avesso
Leonardo Boff – teólogo expulso de sua confraria por achar que Deus chorava o choro dos humilhados
Gaston Bachelard – velho filósofo que desconfiava que os humanos são feitos de metáforas
Manoel de Barros – velho poeta para quem as palavras são coisas nas quais se pode até pegar
Frei Betto – teólogo que ama um mundo longínquo
Mário Quintana – velho poeta que nunca ocupou uma cátedra da ABL
Artur da Távola – velho amante da música que mostra o que muitos ouvidos não escutam
G.H. – mulher que descobriu que Deus pode ser uma amarga secreção de barata
Miguilim – menino que tinha muitas saudades do que ainda nem tinha vivido
Alice – criança que habitava vários mundos
Jorge Luis Borges – escritor que entendia línguas esquecidas e as traduzia em estórias que bem poderiam ter existido
Eduardo Galeano – jornalista que não se esquiva de morar na utopia
Adélia Prado – poetisa que anda na companhia de suas saudades

quarta-feira, 16 de abril de 2008

A Rebelião dos Demônios

Quem conhece o Juventude e Rebelião, organização “política” ligada ao PCR (Partido Comunista Revolucionário), que atua em diversas localidades e em diversas frentes nos movimentos estudantis, e teve a oportunidade de ler Os Demônios, romance do prosador russo Fíodor Dostoiévski, tem que achar uma correspondência imediata. Aqui em Patos, como os personagens reais dessa trama existem, dá para fazer umas comparações bem interessantes. Vou colocar até de um jeito bem esquemático pra vocês entenderem:



É realmente espantoso como as duas cidades se parecem. No livro, uma comarca perdida, longe de tudo; na história real, Patos, no meio do Vale das Espinharas, sertão da Paraíba. Além disso, as duas têm em comum o fato de que nelas se instala uma célula de uma organização política com vistas à Revolução Socialista. Um socialismo bastante peculiar, pois tudo deixa evidente que os únicos interessados numa revolução são na verdade seus líderes, no caso do romance, Piotr Stiepánovitch, que deseja manipular a pequena célula existente na distante província da maneira mais conveniente possível. É engraçado como ele fica o tempo inteiro prometendo aos outros participantes que algo grandioso está para acontecer, inclusive insistindo que sua presença na cidade foi uma ordem dada pela célula-mãe da capital e que ele está ali numa missão importantíssima para todo o movimento geral, ou como costuma dizer, “a causa comum”. Isto gera um clima paranóico que aflora por todos os lados. Os militantes, acreditando que o que fazem é extremamente subversivo, perseguem uns aos outros, vigiam com receio de serem delatados e vivem na iminência de que a polícia está para dar uma batida neles a qualquer instante. Ele ainda diz que há dezenas de outras células agindo à surdina ao mesmo tempo por todo o país, quando na verdade isso é uma invenção para convencer os outros militantes de que eles fazem mesmo parte de algo bem maior.

Dostoiévski insiste num ponto valioso: o fenômeno da confusão entre Ideal e Pessoa. Para o próprio Piotr Stiepánovitch, fazer com que seus fiéis seguidores não enxerguem os ideais socialistas além daquilo que ele mesmo fala, é imprescindível. No romance fica claro que Stiepánovicth deseja se tornar um com o socialismo para que os demais militantes não possam pensar por si mesmos. O socialismo é uma manifestação de Stiepánovitch e Stiepánovitch é uma manifestação do socialismo. É assim que as coisas devem ser entendidas para os outros, e eles não devem questionar isso. Aliás, se me permitem o devaneio, esse pensamento está na ordem do dia de qualquer tipo de ditadura, política ou ideológica. Na União Soviética, por exemplo, o marxismo se tornou ideologia do Estado, confundindo-se com o próprio Estado, e Stálin fez o mesmo quando criou mecanismos para se mostrar ao povo russo como sendo o próprio Socialismo (um projeto social e político que não tinha jamais essa intenção). Hitler queria se mostrar aos alemães de maneira a aparecer sem nenhuma distinção com o Estado Alemão Nazista – ele era o Führer, o Guia, o Farol para a nação. George W. Bush quer ser a personificação da Democracia de seu povo, para ele a única viável no mundo, de modo que qualquer outra pode estar do lado do mal.

Piotr Stiepánovitch, que deixa claro durante vários momentos do romance que é um manipulador, prefere não se meter quando a coisa esquenta. Em determinado momento, começa a haver uma insatisfação dos operários de uma fábrica da província – semelhante à manifestação estudantil que ocorreu nas FIP em 2007, em ocasião da visita do governador do Estado. Não se pode dizer ao certo se o grupo de Stiepánovitch foi quem incitou esses operários a se levantarem. Na opinião de Piotr, os operários dos Chpigúlin – como são chamados – não têm capacidade de tomar uma atitude sozinhos, sem uma liderança intelectual (no caso ele próprio). Acontece que esses operários aparecem diante do palácio do governador von Lembke exigindo uma audiência. Após uma confusão, alguns deles são punidos pela força da guarda policial. Onde estava Piotr Stiepánovitch? Muito longe dali. Já os militantes do Rebelião, coitados, apanharam tanto da polícia que – dizem –, no dia seguinte, os policias estavam todos doloridos de tanto bater na rapaziada. E, ao que parece, os líderes do movimento saíram ilesos.

Além dos líderes, claro, as comparações se estendem também aos militantes. No romance há um personagem, Erkel, que tipifica de maneira magnífica o militante médio dessas organizações. Esse personagem, jovem, cheio de ideais, caiu nas graças de acreditar em toda a verborragia de Piotr Stiepánovitch e passou a segui-lo cegamente. Erkel foi, de todos os que participaram do assassinato de Chátov – que supostamente ameaçava delatar a célula às autoridades – o que mais agiu friamente. Sua crença e devoção à causa comum fez com que concordasse com tudo o que Piotr Stiepánovicth falava. Stiepánovitch discursando era o próprio Socialismo falando. Este, depois que havia causado confusões demais na província, fugiu para São Petersburgo e de lá para o estrangeiro. Quando partia, prometeu a Erkel que viria logo, sua viagem seria breve e que quando voltasse retomariam os projetos. E nunca mais. Dostoiévski deixa claro que esse tipo de jovem, sequioso por mudanças, quando se apega ao primeiro belo palavreado de um manipulador como os Piotr Stiepánovitchs espalhados pelo mundo, pode realmente se converter numa força destruidora. Ou inerte.

E depois falam que é exagero meu quando digo que Dostoiévski consegue explicar muitas coisas…

terça-feira, 15 de abril de 2008

Bibliotecas públicas de Patos - Parte I

Você gosta de ler e não sabe onde os livros estão? Acha que um livro serve para algo mais que um simples calço da sua geladeira? Você gostou de ler algo (emprestado de alguém) e queria ler outra coisa, mas não tem grana pra comprar? Então isto é para você.



Sabemos que há muitos leitores em Patos – sejam eles universitários ou mesmo pessoas já bem iniciadas no gosto pela literatura – que não fazem idéia de que aquele livro difícil está mais próximo do que se possa imaginar. Próximo sim, mas talvez não tão acessível. As políticas das bibliotecas públicas de Patos mais afastam que atraem os leitores, e talvez seja essa a razão de desconhecermos tanto os nossos acervos, de forma que mal ouvimos falar em alguém que freqüenta esses espaços. Algumas bibliotecas possuem títulos de encher os olhos, mas que não oferecem tanta facilidade ao leitor. Um exemplo disto é o caso do Instituto Histórico e Geográfico de Patos – aquele ali na praça João Pessoa. Ou é Edivaldo Mota? Enfim! Na praça do CEPA –, que, se seguisse o espírito dos IHG’s do Brasil, promovendo a cultura e a difusão do saber de modo a contribuir no fortalecimento da identidade nacional, deveria abrir as portas de sua biblioteca ao público em geral. No entanto, os sócios são os únicos a quem é permitido levar livros para casa e sustentam essa atitude em função, segundo eles, do zelo pelo que dispõem. Concordamos que eles tenham essa autonomia, já que não existe o caráter de coisa pública por lá. Mas, e quando esse argumento do zelo excessivo é sustentando por todas as bibliotecas públicas da cidade que conhecemos? A própria Biblioteca Municipal, que, segundo muitos, é uma das meninas dos olhos do vereador José Mota Víctor, também sequer permite a locação de qualquer de seus títulos!

Claro que ouviram-se rumores de que isso estava para mudar e que iriam implementar um sistema de cadastro de controle que daria a chance a um sujeito de pegar um livro e passar ao menos uma semana com ele. Chega a dar pena do indivíduo que queira ler Guerra e Paz ter de sentar-se a uma daquelas mesas durante vários e muitos vários dias. Ou seja, ela é pública pela metade. Além disso, a catalogação e organização das obras é precária, e isso dificulta também o acesso - como ocorre na Fundação Ernani Sátiro, aquela, que ninguém sabe que existe, próxima a sede do bloco Baicora. Chegamos a ver lá uma sala decrépita que menos parecia um lugar de leitura, estava mais para sala de alcance das graças, onde os romeiros vão deixar pernas e braços mecânicos, vidros com coisas verdes ou amarelas dentro para provar que o santo obrou mesmo um milagre. A julgar pelos títulos, há lá uma boa biblioteca, de acervo interessante. O negócio é que quem quiser ler, primeiro tem que contar um pouco com a sorte de achar a sala aberta, e chegar cedinho pela manhã, se realmente quiser ler alguma coisa só até o meio-dia, já que de tarde não há expediente.

Como esse é um assunto que rende bastante, o Soda Cáustica dará início a uma série de comentários sobre as bibliotecas públicas de Patos, ajudando assim a você, caro leitor, a se orientar melhor com relação aos acervos do município: onde encontrá-los, os problemas de cada um, acessibilidade, títulos e autores, estado de conservação, enfim! o que quer seja tido como relevante. Esperamos que você goste.

Polêmica! Soda Cáustica censurado!


Caros leitores,

Depois de há apenas algumas horas antes ter linkado o Soda Cáustica à sua página principal, ontem mesmo a equipe técnica do patosonline.com acabou banindo-o por ter concluído que a entrevista de abertura do Soda não era exatamente o que pensaram, ou talvez por ela ter atingido um de seus colunistas. Bom, seja como for, a questão é que já no Editorial do blogue está absolutamente explícito que um de seus objetivos principais é troçar da maneira com "que alguns artistas e intelectuais, figuras da cidade em maior evidência (poetas, jornalistas, romancistas, pintores, músicos, só para descriminar) costumam ser tratados com toda uma pompa que, sinceramente, ainda não encontramos a razão de ser."

Por este motivo, a equipe do Soda não aceita como justificado o fato de o blogue ter saído do número dos links do Patosonline. No entanto não quer, com isto, exigir nada, mas apenas apontar a arbitrariedade com que
os blogues são admitidos no site.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Música erudita nordestina

Para quem gosta de música erudita e, sobretudo, dos ritmos do nordeste brasileiro, vale a pena conferir o trabalho do Quinteto Armorial.

Criado na década de 1970, em Recife, o Quinteto, que está ligado ao Movimento de mesmo nome, fundado pelo escritor paraibano Ariano Suassuna, deu à música popular nordestina ares de erudição e uma imensa projeção, tanto no país quanto fora dele, rompendo assim com a idéia capenga de que deve haver sempre alguma distinção entre as duas formas – popular e erudita – de expressão musical.

Quem deseja conhecer um pouco mais os trabalhos do grupo é só clicar aqui

Entrevista: João Carlos Cabrío comenta a literatura patoense de hoje

O Prof. João Carlos Cabrío é Doutor em Teoria Literária, e Literatura Comparada, pela Universidade de São Paulo (USP); é livre-docente da Universität Wien, Áustria; autor de diversos livros sobre cultura popular; consultor da Editora da USP; e atualmente desenvolve um trabalho valioso de captação da chamada literatura menor por todo o território brasileiro. Como já está há algum tempo em contato com a literatura patoense, em entrevista inédita ao Soda Cáustica, o Prof. Cabrío abre o verbo a respeito da produção literária no Sertão das Espinharas.

Soda Cáustica: Olá, Professor, tudo bom?

J. C. Cabrío: Tudo. É um prazer colaborar com o blogue de vocês.

SC: Nada! O prazer é nosso. Mas e então, Professor Cabrío… por que Patos?

JCC: A verdade é que, se você comparar a quantidade de novos autores lançados pelas grandes editoras brasileiras, a partir de meados da década de 1990, com os que surgiram no mesmo período, mas de maneira independente, aqui em Patos, verá que o número de novos autores nesta pequena cidade sertaneja, bem como o valor de sua produção, é bastante significativo.

SC: O que o senhor acha então que motivou esse surto de novos talentos, justo aqui em Patos?

JCC: Bom, em primeiro lugar o fato de que o surgimento de novos autores é uma das conseqüências do sistema de formação de quadros que correspondem às necessidades de uma determinada comunidade. No entanto, não podemos esquecer que o início da atividade literária em formação aqui gera atitudes que já demonstram convincentemente participar da mudança do investimento em reciclagem técnica. Por outro lado, a revolução dos costumes auxilia à preparação e à composição de alternativas às soluções ortodoxas. Agora, a certificação de metodologias que nos auxiliam a lidar com a percepção das dificuldades de criação artística possibilita uma melhor visão global do fluxo de informações. Por fim, o incentivo ao avanço de novas formas de expressão e a complexidade dos estudos efetuados, que, como já sabemos, facilita bastante à criação das mais diversas correntes de pensamento. O que é realmente ótimo!

SC: O senhor poderia então listar os principais autores desse cenário?

JCC: Sim, claro. Mas veja... há muitos. No entanto, de todos, três têm obras que apresentam maior regularidade de temas e preocupações suscetíveis de uma tipologia. Vou me apegar então apenas a estes, a saber, Wandecy Medeiros, talvez o maior deles; Misael Nóbrega, de cuja prosa há muito o que comentar; e, claro, José Mota Víctor.

SC: De uma maneira geral, como o professor classificaria as obras destes autores?

JCC: Antes de qualquer coisa, temos que ter sempre em mente que a consulta aos autores agrega valor ao estabelecimento das formas de análise. Em José Mota, por exemplo, é fundamental ressaltar que a hegemonia do ambiente artístico atribui sentido ao estabelecimento da gestão inovadora da qual fazemos parte. Já em Misael Nóbrega, não. Ele esquece que a complexidade dos estudos efetuados representa uma abertura para a melhoria dos métodos utilizados na avaliação de resultados finais. O que é bem diferente. O trabalho de Wandecy, por outro lado, é o que mais me agrada porque, se, como vimos, José Mota está preocupado com a hegemonia do ambiente artístico, e Misael parece estar alheio à abertura para a melhoria dos métodos utilizados em literatura, Wandecy atende à importância dos problemas dos quais fazemos parte. Nele, podemos já, então, vislumbrar o modo pelo qual o acompanhamento das preferências artísticas auxilia à preparação e à composição das formas de ação. O que, para mim, é bem mais relevante.

SC: Quer dizer então que de alguma forma há, por parte do senhor, certo descontentamento com relação a Misael Nóbrega? É que nós já pudemos sentir algo assim na resposta anterior…

JCC: De forma alguma. Minha crítica se direciona especificamente a alguns de seus temas, sobretudo os abordados em seu mais recente trabalho, Folhas do Álamo. Só para dar um exemplo, na crônica Espelho, ele diz: “O homem é responsável pela ruína do cenário constituído. Exacerba-se para conseguir algum achado, no entanto, quando chega o instante… Lambuza-se com a gosma do prêmio. Brota, assim, o inusitado como fenômeno para a banalização da vida (o homem banaliza o que gosta).” Essa postura infantil-pessimista diante do mundo se perpetua em várias outras crônicas, tais como Inveja, Sonhos, Auto-afirmação, enfim. O que nos leva a crer que todas estas questões, devidamente ponderadas, levantam dúvidas sobre se a percepção das dificuldades facilita a criação dos conhecimentos estratégicos para atingir a excelência. Todavia, a necessidade de renovação processual causa impacto indireto na reavaliação dos níveis de motivação do espírito humano. O que é absolutamente inadmissível em literatura.

SC: O senhor falou que Wandecy Medeiros é, talvez, o maior desses nomes. O que o leva a dizer isso?

JCC: Acredito que a posição que ele ocupa em relação aos outros é privilegiada. Apesar de José Mota ter começado na geração anterior, como teatrólogo, Wandecy tem a incrível capacidade de produzir muita coisa em um espaço bem curto de tempo. Desde sua aparição com o lírico-sentimental Poesias para Deus e para o Coração (1998), até o mais recente pUezya(2006), já se foram quase dez livros. Só para se ter uma idéia do que isso significa, Arthur Rimbaud, um dos maiores poetas do século XIX, durante toda sua vida escreveu um único livro, Une Saison en Enfer, que, por sinal, vendeu muito pouco. Caso semelhante ocorreu com o também paraibano Augusto dos Anjos. Só isso, a meu ver, já é por si só um mérito indiscutível de Wandecy.

SC: Você não é o primeiro crítico a comparar Wandecy Medeiros a Rimbaud. Flávio Sátiro Fernandes, crítico literário paraibano e autor do prefácio do pUezya, já colocou Wandecy junto ao poeta francês bem como a outros poetas malditos. Em que sentido o senhor acha que há espaço para tal comparação?

JCC: Ora, no sentido de que Wandecy Medeiros, assim como Rimbaud, é absolutamente perturbador. Considere só, como exemplo, esse trecho de Meu amigo computador:

“Ele [o meu computador] tem seus programas
Word, Windows, Excel e coisas mais
Hardware, software e impressora
Que imprime o texto que você faz

Ele é muito inteligente
E eu não vou dar mancada
Para vencer esse cara
Eu desligo a tomada”

Incrível, não há dúvidas! Perceba que, na primeira estrofe, o fenômeno da expansão tecnológica causa impacto indireto na reavaliação das posturas dos sujeitos sociais dirigentes com relação às suas atribuições. Isso culminará, como se pode ver na estrofe seguinte, numa das mais brilhantes críticas do avanço tecnológico sobre o espírito humano, assim como no desenvolvimento contínuo de distintas formas de atuação sobre o mundo no qual estamos inseridos.

Sinceramente, quando eu leio isto, sinto que o experimento em questão acumula a expansão do desenvolvimento mundial que soma valor ao estabelecimento de todos os recursos funcionais e poéticos envolvidos. É claro que a proposta desafiadora de Wandecy neste cenário estético global, talvez venha a ressaltar a relatividade das diretrizes de desenvolvimento para o futuro. Ainda assim, existem dúvidas a respeito de como a execução dos pontos do seu programa auxilia a preparação e a composição do investimento em reciclagem da poiesis. E isso me lembra muito o que diz Bakhtin a respeito.

SC: Alguns críticos têm apontado como débil o fato de Wandecy “reciclar” vários trechos, frases e até mesmo poemas inteiros de um livro para outro. Qual sua opinião a respeito?

JCC: Na verdade, eu vejo isso como uma espécie expressão de vanguarda, já que é importante observar que o novo modelo estrutural por ele preconizado (dito wandecyniano) modifica as condições poético-formais exigidas pelos novos tempos. Por outro lado, a necessidade de renovação processual representa uma abertura para a melhoria da proposta artística local. As experiências acumuladas demonstram que a crescente influência da mídia deve fazer com que a poesia passe por uma reavaliação estética, como é o caso de Wandecy, que esteja em sincronia com os recentes paradigmas da expressão hodierna. A repetição de um mesmo trecho, frase ou poema em vários de seus livros é então, a meu ver, o que poderia ser chamado de poesia remix. E não há nada mais original.

SC: Por fim, professor, gostaríamos de encerrar essa entrevista com um comentário geral sobre o futuro da literatura patoense. Então, diante do quadro que nos foi apresentado, o que senhor realmente espera?

JCC: Olhe, no mundo atual, a execução dos pontos do programa literário patoense estimula a padronização das direções preferenciais no sentido do progresso. Nisto estou otimista. Porque afinal a certificação de metodologias que nos auxiliam a lidar com a adoção de políticas livres não pode mais se dissociar dos conhecimentos fundamentais para alcançar uma melhor forma de expressão. O cuidado em identificar pontos críticos na crescente influência da mídia garante a contribuição de um grupo importante na determinação das condições favoráveis ao meio artístico-intelectual. É nesse ponto que um blogue como o de vocês é de suma importância.

Agora, não podemos esquecer de maneira alguma que o acompanhamento das preferências de consumo editorial apresentem, de hoje em diante, tendências no sentido de aprovar a manutenção dos modos de operação convencionais. A nível organizacional, o que tenho a acrescentar é que o comprometimento entre pessoas ligadas ao meio, tais como Wandecy Medeiros, Misael Nóbrega, José Mota Víctor e os demais que não foram mencionados aqui, dá condições de equalização de alternativas às soluções conservadoras. Mas ainda assim, o desenvolvimento contínuo de distintas formas de atuação acarreta num processo de reformulação e modernização dos paradigmas corporativos. E sinceramente, duvido que isso se comporte de outra forma.

SC: Bom, então, muitíssimo obrigado, Professor João Carlos Cabrío, pela entrevista. Foi um imenso prazer conversar com o senhor.

JCC: Igualmente (risos).

SC: E esperamos que o senhor, qualquer dia, volte a colaborar com a gente.

Entrevista concedida à equipe do Soda Cáustica em 28 de janeiro de 2008.

Editorial

Saudações, leitores da cidade de Patos! Temos muito o que conversar. Mas é claro que nada se decide assim, numa primeira abordagem. Se alguém criou expectativas porque ouviu falar que esse blogue estaria por aparecer ou mesmo porque estava há muito esperando por algo, só não sabia objetivamente o que era, a hora para afobamentos, por favor, não é essa. Esse muito a se conversar será distribuído ao longo desse novo ambiente. Preferimos nesse instante apenas semear, e regar com um pouco de soda cáustica, a vontade e o gosto de quero ver mais. E preferimos assim, não entregar o jogo agora, mas só aos bocadinhos, a conta-gotas.

É verdade que esse blogue está intimamente mais identificado com o público de Patos, capital do sertão da Paraíba. Mas esse público, ao encontrar coisas de seu quinhão, tratados aqui com o máximo de cuidado, humor, seriedade, ludismo – por mais incompatíveis que possam ser –, poderá sentir também algum tipo de cosmopolitismo (talvez seja efeito da internete mesmo). Também encontrará uma maneira distinta de tratamento sobre muitas questões. Os que assinam e colaboram com esse blogue partilham de um desejo antigo de poder dispor de um espaço livre, independente dos patrocínios (anúncios, é como chamam alguns) que mantêm certos veículos de comunicação impressa da nossa cidade. A internete se mostrou atrativa a um projeto assim porque o próprio patoense tem se familiarizado com esse universo. Vamos aproveitar o momento.

No geral, o leitor poderá acompanhar a nossa opinião sobre temas que muitos outros já opinam. O foco básico será o cenário cultural de Patos. Assim como nós, muitos leitores estão enfadados com a forma com que alguns artistas e intelectuais, figuras da cidade em maior evidência (poetas, jornalistas, romancistas, pintores, músicos, só para descriminar) costumam ser tratados, com toda uma pompa que, sinceramente, ainda não encontramos a razão de ser. Viemos para mostrar quando o rei está nu sempre que estiver. Portanto, esse é o nosso diferencial em relação às opiniões corriqueiras. Na medida em que for necessário, Soda neles!

Mas tudo não estará restrito a isso. Lógico que não. Esta será a parte divertida do negócio, pois o blogue trará também entrevistas, resenhas de livros, comentários sobre artigos da imprensa local, discussões sobre arte, filosofia, informações sobre eventos de natureza diversa e tantas coisas mais. Para tanto, contamos com uma lista altamente gabaritada de colaboradores. Alguns deles surgirão logo, outros além, mas acima de tudo conforme formos ganhando adeptos e a nossa empreitada engrenar. Aqui o leitor de Patos terá a presença ilustríssima de um dos nossos maiores colaboradores e incentivadores, o Prof. Dr. João Carlos Cabrío, da Universidade de São Paulo (USP), cuja entrevista inédita concedida à equipe do Soda Cáustica você acompanhará logo abaixo. Sua brilhante participação lançará luz sobre questões de extrema relevância para nossos intelectuais e artistas. Mais: o Soda Cáustica será mantido com a ajuda de muitas outras mãos, todas, é claro, devidamente paramentadas de luvas para evitar acidentes, já que a insalubridade e a periculosidade daquilo que manuseamos é alta. Todo esse risco nós corremos para jamais faltar com nosso lema: "Leia antes de beber!". Nosso esforço é tornar o leitor mais seletivo ao conhecer de um jeito diferente muitas coisas que aparecem na cidade.

E já que falamos no leitor, para finalizar essa postagem inaugural, queremos dizer que a sua colaboração é algo mais que esperado através dos espaços abertos a comentários, sugestões, solução de dúvidas, enfim. Nós moldaremos nossa cara na medida em que for interessante agradar o público. Além disso, com o tempo e com a paciência desse leitor, melhoraremos em estilo de escrita, expressão, temas, qualidade do texto em geral.


Saúde!